sábado, 25 de outubro de 2014

SEM TÍTULO

A vontade foi arrancar-lhe
A verdade pela garganta,
Enfiando-lhe os meus dedos
Puxando-a direto de suas pregas vocais
Para que ela não se escondesse entre seus dentes sujos.

Eu queria que dissesse a verdade,
Sob tortura mesmo, já que perguntar não adianta.
Queria que me dissesse o quanto me odeia,
Mas você continua a dizer as coisas do modo como sempre diz:
Mentindo.

A vontade foi lhe socar o estômago
Até que vomitasse o que tinha a dizer
Chutar-lhe a barriga até que, junto com o sangue
Aquele que você fez brotar em mim
Com suas mentiras.

A vontade foi extirpar-lhe uma a uma
Suas unhas cheias da merda que sai da sua bunda
Arrancá-las e fazê-lo comer, uma a uma,
Pedaço a pedaço até que se sufocasse e morresse,
Enfim.

A vontade foi lavar-lhe a cara suja
Com soda cáustica.
Essa cara suja das bundas azedas,
Que você passa os dias e as noites lambendo
Pensando que alguém um dia vai se lembrar
Que tenha, de alguma forma,
Peidado-lhe na cara, fazendo-lhe o favor
De deixar-lhe cheirar as tripas.

A vontade foi arrancar seus cabelos,
Quebrar-lhe os dedos
Emudecer-lhe cortando a sua língua
Para não ouvir mais a sua fala nojenta,
Bajulando gente que não gosta de você,
Que não lhe respeita de verdade.

Todo o mal que lhe desejo ainda parece ser pouco,
Pouco para a sua sede de humilhações,
Para o quanto você é capaz de se abaixar
Por tão pouco,
Por atenção de gente infinitamente mais baixa que você,
Por companhia para beber a bebida que você vai deixar fiado,
Por passar o dia inteiro se embebedando,
Principalmente de lixo que vem das conversas,
Fofocas alheias,
Da sujeira das ruas,
Do dióxido de carbono dos carros a passar,
Das maledicências,
Das quais você também é vítima, mas acha que não é,
Por estar no grupo daqueles que falam, em pé entre eles
Sempre com esse sorriso forçado pelo álcool
Sorriso fácil, vazio
Insignificante.

A vontade é lhe enfiar uma garrafa abaixo,
Quebrada,
Cacos, tampa de metal,
Rótulo de papel,
O copo seboso que anda entre seus dedos,
O cheiro de roupa suja que você exala
O bafo azedo desse mijo que você ingere
Comprado com o nome de cerveja.

A vontade é acordar uma hora dessas com a notícia de sua morte.
Mas eu sei que seu corpo é fechado.
Bala, faca, língua, nada entra nele,
Para falar a verdade, você tem tentado todo dia se matar aos poucos,
Mas a saúde parece ter preguiça de ir de seu corpo.
Uma coisa aqui, outra ali, e você vem mais forte do que antes.

Como me livrar de você?
O que eu posso fazer para me livrar de você?
Eu gostaria tanto de dizer que eu te amo, pelo menos,
Mas não amo. E nem você me ama.
Mas amor não é solúvel em álcool, já sabemos disso,
Não se engarrafa,
Não se vende gelado.
O que eu posso oferecer?

A sua sorte é o fato de eu ser covarde,
Enraizado, endividado,
Dependente.
Se não fosse isso,

Fugiria daqui sem lhe dar um mínimo de satisfação.

Nenhum comentário: